quinta-feira, 30 de abril de 2009

Escriatura


Recomeço a escrita, a partir do corpo, das pautas da pele, dos sentidos. O instinto é meu guia e todas as alusões são consequência da relação do corpo com a natureza, a representação exterior e com a alma, o sentimento interino.Aos poucos, e lentamente, acontece o reconhecimento das coisas, do outro, das palavras e seus significados que, agora, parecem ter um peso maior na construção dos argumentos, na organização do pensamento.
A vida observada em terceira pessoa, por detrás da quarta parede, é convidativa e sedutora, mas já não posso gozá-la como antes. É um gozo diferente, epitelial, contido que economiza energia para todos os outros; é a negra iluminação arquitetada a cada dia, aprendida, reaprendida. É o silêncio em resposta às necessidades alheias (que incomodam), é a aceitação do ser como indivíduo único imperfeito que se relaciona com o meio do qual faz parte, de forma intensa e destemida.
Me entrego à vida, como à morte. A vida é a morte. Dessa maneira, começam a surgir os esboços poéticos abstratos; palavras soltas, amplas de significados, curtas, compridas, às vezes ultra genéricas, às vezes não. No entanto, uma palavra, a partir do momento em que o "r" mais forte - desses que bem caracterizam o infinitivo - se deixa visto, é impossível não sucumbir à continuação da frase, do parágrafo, do verso, da fala, do texto...
Tudo mais explícito nos parâmetros da concreta compreensão - que nenhuma ligação tem com qualquer juízo de valor. Não há limiar entre o verdadeiro e o falso, o certo e o errado. Apenas um impulso, uma improvisação cada vez mais consciente do que a vida oferece. Nada mais é que a expressão do pensamento (não em sua plenitude; a escrita não é capaz de acompanhar a velocidade do pensar subjetivo. A escrita é linear, o pensamento dilui-se em múltiplas variações, as quais a tradução motora é incapaz de acompanhar).
Fato é que, intuitivamente ou não, acontece uma seleção natural (que, neste caso, não faz referência a Darwin)pela qual optamos por utilizar este ou aquele termo. Somos nós os determinadores de nossa expressão e fazemos isso pensando, sempre, no olhar do outro. Do outro que lê. Mesmo que este outro sejamos nós mesmos.
Assim é a vida; um compilado de textos, um mar de signos, o pensamento traduzido em atos, sempre inacabados.

5 comentários:

Livia De Marco disse...

a escrita que se imprime num vazio dela irrompe a escriatura como novidade ultima do(e) ser.

Bernardo Caldeira disse...

Uma leve brisa vem com o vento, vai como vento e pisca os olhos no momento da sua desaparição em meio ao inteiro dos dias pelos quais demonstra seu interesse por borboletras e não julga necessário dar-se mais explicações além do que fosse nesse sáurio o lugar donde co-meçam todas as suas indagações sobre a vida dos palermas tão calmos quanto almas depenadas...

www.semtidogozado.blogspot.com

Bernardo Caldeira disse...

Se este ser for, seria um ser que é a ti ligado por uma cadeia diacrônica de elos somáticos.

Gostei do seu blog, mesmo.

Me parece que procê, a escrita é uma nessacidade de chutar o pau da barraca, de explodir em letras, signos e significantes aquilo que aí dentro se implode (quem sabe implora?) numa pressão de panela.

Não que eu saiba algo sobre você, mas também não sou completamente ignorante: vc, como eu, gosta de Bergman (eu, particularmente, amo, inclusive comecei a aprender sueco por causa de seus filmes). Vc, como eu, vai ao analista.

E etc. e Tao...

PS: "o beijo desrespirado" é fino!
PS2: Não sei pq te disse essas coisas. Me deu vontade.

Pra finalisar os seus cabelos poemas e avescruz-credo, proponho sob a mesa-redonda os cavalheiros da távola quadrada a s'estourear feito que os que picam Don zelam por nostras calmas sofridas, calos sexuais dos quais nada temos a temer; e, se aindassim, não quiseres decifrar - caso se cifre - guarde consigo o caminho seguido até então, já que após o parto, perto D'eus, j'há mais ainda antes tarde do que nunca.
Teje dito.

Bernardo Caldeira disse...

Ou melhor, não gostei do seu blog, mas da sua esgrita.

Bernardo Caldeira disse...

""A beleza da poesia esconde-te em teu mistério""...